Crianças autistas eram amarradas a um radiador num hospital psiquiátrico no Líbano?
Provavelmente, você já deve ter visto essa foto circulando em alguma publicação no Facebook. Na absoluta maioria dessas postagens é alegado que a foto representaria crianças autistas amarradas a um radiador, num hospital psiquiátrico no Líbano, no ano de 1982.
Um exemplo disso é uma publicação de uma determinada usuária, em janeiro de 2019, que já obteve mais de 57 mil compartilhamentos no Facebook (arquivo):
Segundo a usuária, essas crianças autistas amarradas a um radiador serviam de exemplo sobre o porquê “não existiam” autistas antigamente. Essa seria a razão pela qual as pessoas não tiveram “coleguinhas autistas” em sala de aula, na igreja ou na faculdade. Na parte final da publicação, a usuária alegou que “por falta de conhecimento da sociedade como um todo, coisas horríveis aconteceram”. Enfim, nitidamente uma publicação com grande apelo emocional.
É importante deixar claro, que a associação dessa foto com tal narrativa não é exclusividade dessa usuária. Basta realizar uma simples pesquisa em mecanismos de busca (1 | 2 | 3) ou através de mecanismos nas próprias redes sociais (1 | 2 | 3 | 4 | 5) para ver a dimensão que isso sempre teve ao longo dos anos. Embora a maioria das publicações não indique qual seria o nome do hospital ou sua localidade, algumas delas alegam que se trataria de um hospital psiquiátrico no Líbano!
Uma Recente Publicação
Recentemente, no dia 16 de janeiro de 2020, uma página chamada “Inocência Autista”, no Facebook, compartilhou essa imagem (arquivo) com a seguinte alegação:
“Crianças autistas e com outras síndromes eram amarradas a um radiador num hospital psiquiátrico em 1982“
Curiosamente, o texto publicado faz referência a Villa Azzurra, um antigo instituto psiquiátrico para crianças de Turim, na Itália, dando a entender que a foto poderia ser tirada nesse local (no decorrer do artigo comentaremos sobre esse instituto e as demais fotos publicadas pela página).
Naturalmente, muitas pessoas ficam chocadas e aterrorizadas com essa foto, mas será que ela realmente mostra crianças autistas? Tais crianças autistas eram realmente mantidas dessa forma nesse hospital psiquiátrico no Líbano? A foto foi realmente tirada em 1982? Descubra agora, aqui, no E-Farsas!
Verdadeiro ou Falso?
Fora de Contexto! Embora essa foto seja verdadeira, e tenha sido tirada pelo fotojornalista francês José Nicolas, no interior de um hospital psiquiátrico de um vilarejo chamado Deir al-Qamar, no Líbano, em 1983, ela não necessariamente se refere a crianças autistas. Além disso, a foto não necessariamente retrata uma medida rotineiramente adotada por enfermeiras ou médicos desse hospital.
Portanto, é impreciso associar essa foto a crianças autistas e dizer que elas, independentemente de seus quadros clínicos, eram habitualmente amarradas naquele local. Para entender melhor essa situação é necessário que vocês acompanhem atentamente, sem frenesi, este artigo.
Um Situação que Poucos Imaginariam
A absoluta maioria das pessoas não faz a menor ideia do que estava acontecendo no momento daquele registro. Naquela época, os drusos (uma comunidade autônoma que segue uma religião próxima ao Islã e fala a língua árabe), liderados por um homem chamado Walid Joumblatt, cercaram completamente o vilarejo de Deir al-Qamar, que estava em poder das Falanges Libanesas (também chamadas de Falanges Cristãs). O motivo? A Guerra Civil do Líbano. Havia uma disputa multifacetada de poder basicamente envolvendo milícias religiosas (cristãs, sunitas, xiitas, drusas etc…). Não entraremos em detalhes sobre essa guerra, mas podemos dizer que foi um banho de sangue marcado por diversas fases, e que durou cerca de 15 anos! Muitas atrocidades foram cometidas por todos os lados.
Enfim, o hospital — aquele onde aquelas duas crianças estavam — havia sido severamente afetado pelo confronto entre os drusos e as Falanges Libanesas. A situação estava simplesmente caótica. Num determinado momento, um acordo foi assinado com o exército israelense (Israel havia se aliado as falanges cristãs após invadir o Líbano na década de 1980) para a evacuação das Falanges Libanesas e parte da população local.
E no Meio de Toda Essa Loucura
No meio de toda essa loucura, quem cuidava dessas crianças eram freiras, que por sua vez fizeram tudo o que podiam por elas até o último momento. Contudo, elas tiveram que deixar o hospital e, infelizmente, os doentes ficaram para trás, incluindo as duas crianças da foto. Posteriormente, os “Médicos do Mundo”, uma organização não-governamental de ajuda humanitária, foram regastar esses doentes.
Aquelas crianças amarradas no radiador, naquele hospital e naquele momento, refletem uma situação improvisada no meio de uma guerra civil. Isso não quer dizer que elas eram mantidas rotineiramente naquele local.
E aí vocês podem perguntar: Elas poderiam ser ocasionalmente mantidas daquele jeito? Não sabemos, porque não há informações sobre isso. O que sabemos é que aquela foto retrata uma situação improvisada em meio a um cenário de caos. Faltava de tudo no hospital, incluindo leitos.
Entramos em Contato com o Autor da Foto
Na quinta-feira passada (16) entramos em contato com fotojornalista José Nicolas, que nos explicou por email o contexto dessa foto. Nascido em 1956 em Casablanca, no Marrocos, José Nicolas iniciou sua carreira de fotógrafo num jornal local, e em várias organizações humanitárias assim como os “Médicos do Mundo”. Isso lhe permitiu viajar para várias partes do mundo, incluindo o Curdistão, o Afeganistão, o Líbano etc…
Em seu email ele não disse, em nenhum momento, que estávamos diante de crianças autistas. Em princípio, seriam crianças com transtornos mentais, que estavam sendo cuidadas no hospital psiquiátrico. Não havia uma especificidade em relação as condições clínicas dessas crianças. Assim sendo, tudo indica que essa narrativa de serem justamente crianças autistas foi inventada em algum momento “recente” da linha do tempo.
Enviamos um outro email para José Nicolas reforçando sobre essa questão das condições clínicas das crianças, mas não recebemos nenhuma resposta até o fechamento deste artigo. Caso isso aconteça, manteremos vocês informados, combinado?
Era Possível Ter uma Noção Sobre o Contexto Verdadeiro dessa Foto sem Entrar em Contato com o Autor?
Sim! Através do site do José Nicolas, onde é possível notar que essa foto faz parte de uma série chamada “French Doctors, l’aventure humanitaire“.
O fotojornalista viajou juntamente com médicos franceses para países em guerra, entre 1982 e 1987. No Líbano, entre 1982 e 1983, ele registrou o árduo trabalho dos Médicos do Mundo e dos Médicos Sem Fronteiras. Em 1984, ele visitou o Curdistão e o Afeganistão e, em 1987, ele acompanhou o socorro a mais de 500 embarcações no Mar da China, com a ajuda dos Médicos do Mundo e da Marinha da França.
Eis a descrição que acompanha a foto:
“Líbano – Der el Kamar, 1983. A cidade é cercada pelos drusos de Walid Joumblatt. Um acordo é assinado com o exército israelense para a evacuação das falanges cristãs e parte da população“
E Como Descobrir o Autor da Foto para Chegar ao Seu Site?
Para descobrir o nome do autor da foto bastava fazer uma busca reversa por imagens, que invariavelmente levaria a um dos maiores repositórios comerciais de imagens na internet, o “Getty Images”. Infelizmente, a descrição que acompanha a foto não reflete seu contexto verdadeiro, apenas o que vemos superficialmente:
“Crianças presas a um radiador, no hospital psiquiátrico de Deir el Qamar, no centro-sul do Líbano“
Enfim, há dois detalhes muito importantes, que precisam ser mencionados.
Em primeiro lugar, o “Getty Images” sempre informou o nome do fotógrafo e a respectiva agência, a Corbis, que posteriormente se passou a chamar Branded Entertainment Network (BEN). Em segundo lugar, não foi mencionado em nenhum momento que as crianças eram autistas.
Para vocês terem uma ideia, nenhum marcador (“tag”) utilizado na divulgação dessa fotografia faz referência ao autismo. Isso já havia sido notado pelo portal italiano de verificação de fatos “Bufale”, num artigo que tentava desmistificar essa foto em 2018.
É Possível Identificar uma Criança Autista com Base numa Única Fotografia?
Não! Atualmente, não há nenhuma tecnologia capaz de identificar uma criança autista com base numa única fotografia. Portanto, dizer, por exemplo, que “as crianças da foto parecem ser autistas” seria, no mínimo, irresponsabilidade. Não há informações suficientes para afirmar que elas possuem autismo. Infelizmente, algumas pessoas utilizam tais fotografias, não se importando com o verdadeiro contexto delas, simplesmente para levantar bandeiras, com um apelo emocional desnecessário e vulgar.
O autismo, denominado tecnicamente de “Transtorno do Espectro Autista” (TEA), é um transtorno do neurodesenvolvimento com prejuízo na área da comunicação e interação social em múltiplos contextos, associado a comportamentos restritos e repetitivos, interesses restritos e alterações sensoriais. Antigamente, os diferentes níveis de autismo eram classificados em diversas síndromes, como a Síndrome de Asperger ou Autismo Clássico. Contudo, atualmente, de acordo com o DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) não há mais subdivisões. O nome “espectro autista” vem justamente para englobar as diferentes gradações da condição.
De alta complexidade, a condição ainda gera muitos questionamentos, tanto entre os especialistas quanto em quem convive com autistas. É importante ressaltar que nem todas as pessoas com autismo vão apresentar as mesmas características, devido à amplitude do espectro e a particularidade de cada caso. Pessoas com um grau mais leve tendem a apresentar dificuldades de linguagem e interação, como compreender piadas ou expressões, mas em geral conseguem ter uma vida independente. Já em graus mais elevados, podem manifestar ausência de comunicação verbal e dependência para realização de atividades do dia a dia.
Embora a maneira de diagnosticar o autismo venha evoluindo com o passar do tempo, com níveis de precisão cada vez mais altos, ainda assim não é uma tarefa tão simples. Imaginem no passado!
Crianças Autistas Foram Submetidas a Tratamentos Controversos ao Longo do Tempo?
Foram e, de certa forma, continuam sendo! Logo, isso não é exclusividade do passado!
A palavra “autismo” foi originalmente cunhada pelo psiquiatra suíço Eugene Bleuler, em 1911, para descrever um sintoma da esquizofrenia, que definiu como sendo uma “fuga da realidade”. Em 1943, após estudar algumas crianças consideradas autistas, um polêmico psiquiatra austríaco-americano chamado Leo Kanner publicou um relato clínico em que definia o “autismo infantil” como uma síndrome específica. No ano seguinte, o médico austríaco Hans Asperger publicou uma tese sobre os “psicopatas autistas” — crianças com inteligência elevada e muitas dificuldades sociais.
Em 1948, Leo Kanner escreveu na revista “Time”, que os pais de seus pacientes eram os responsáveis por provocar o autismo nos filhos ao não oferecerem a eles amor e estímulos. A imagem da “mãe-geladeira” se provou indelével no imaginário popular e, como consequência, duas gerações de crianças autistas foram internadas em instituições e submetidas a “punições” severas, aprisionamento e “tratamentos” experimentais inimagináveis nos dias de hoje.
A Polêmica Terapia Eletroconvulsiva
Em 1964, por exemplo, o psicólogo Ivar Lovaas, da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, passou a empregar choques elétricos em experimentos com crianças autistas, com o objetivo de impedir comportamentos de automutilação entre elas. Diga-se de passagem, a chamada terapia eletroconvulsiva (ECT) é utilizada até hoje em crianças e adultos com necessidades especiais, incluindo crianças autistas.
Aliás, há quem defenda e há quem abomine essa prática, mas não entraremos no mérito dessa questão, porque foge completamente ao nosso escopo.
É interessante destacar, que até a década de 1980 não havia um “espectro do autismo” — o distúrbio era definido por características bem rígidas e era tido como raro. Por causa disso, até então, muitas famílias tinham que levar seus filhos a nove ou dez especialistas até conseguirem um diagnóstico de autismo.
Somente no fim daquela década que uma psiquiatra britânica chamada Lorna Wing introduziu o conceito que depois foi conhecido como “espectro do autismo”.
A Camisa de Força: Uma Breve Análise
Muito antes do advento da psicanálise e desse frenesi que vemos nas redes sociais, a saúde mental era um grande mistério. Os médicos não sabiam como tratar os sintomas de distúrbios como esquizofrenia, depressão, e uma mera ansiedade, por exemplo. Como resultado, eles tentaram uma variedade de tratamentos que, para os padrões modernos, parecem cruéis. A camisa de força era uma delas. Na verdade, no auge de seu uso, era considerada uma forma humanizada de tratar o paciente!
Segundo a Sociedade Histórica do Kansas, nos Estados Unidos, antes da Guerra Civil Americana (1861-1865) os pacientes com transtornos mentais eram colocados em precárias residências, casas de correção ou até em presídios, quando suas famílias não podiam mais cuidar deles. Os pacientes geralmente conviviam com criminosos e eram tratados da mesma forma, trancados numa cela ou acorrentados às paredes.
Na década de 1860, os norte-americanos queriam prestar uma melhor assistência aos menos afortunados, incluindo aqueles com transtornos mentais. O número de instalações dedicadas ao atendimento a essas pessoas aumentou significativamente. Com a pretensão de ser um local de refúgio, essas instalações eram chamadas de “sanatórios de insanos”. Entre 1825 e 1865, o número de sanatórios nos Estados Unidos aumentou de 9 para 62.
Quantidade Não Significa Necessariamente Qualidade
O aumento do número de sanatórios não implicou necessariamente na melhoria dos pacientes. Os médicos ainda não entendiam o que causava o comportamento de seus pacientes. Eles listavam coisas como excitação religiosa, insolação e leitura de romances como possíveis causas de doenças mentais. Muitos maridos, por exemplo, internavam com facilidade suas esposas devido a uma extensa e absurda lista de comportamentos atualmente considerados normais, mas que eram vistos como transtornos mentais.
Além disso, os médicos acreditavam que os pacientes haviam perdido todo o controle sobre sua moral, e uma disciplina rigorosa era necessária para ajudá-lo a recuperar o autocontrole. Assim sendo, o sanatório fornecia a restrição que um paciente não poderia suprir a si próprio. Confinar o paciente em uma camisa de força era uma maneira de fazer isso.
Muitos médicos consideravam as camisas de força uma forma humana de tratamento, muito mais gentil do que as correntes encontradas pelos pacientes nas prisões. A restrição, supostamente, não aplicava pressão no corpo ou nos membros e não causava abrasões na pele. Isso sem contar que as camisas de força permitiam uma certa liberdade de movimento. Ao contrário dos pacientes ancorados numa cadeira ou em camas por cintas ou algemas, aqueles que usavam uma camisa de força podiam andar. Alguns médicos até recomendavam que indivíduos em restrição passeassem ao ar livre, colhendo os benefícios do controle e do ar fresco.
No Entanto…
Embora fossem consideradas um tratamento humanizado por muitos médicos, as camisas de força eram frequentemente mal utilizadas. Com o tempo, os sanatórios ficaram lotados de pacientes e não dispunham de pessoal suficiente para fornecer os cuidados adequados.
Os encarregados geralmente não eram treinados para trabalhar com pacientes de transtornos mentais. Alguns tinham medo de tais pacientes e recorriam a restrições para manter a ordem e a calma. Como resultado, os pacientes podiam permanecer em restrição por dias, muitos dias.
Existe Cura para o Autismo?
Não se conhece a cura definitiva para o transtorno do espectro do autismo. Da mesma forma não existe um padrão de tratamento que possa ser aplicado em todos os portadores do distúrbio. Cada paciente exige um tipo de acompanhamento específico e individualizado, que exige a participação dos pais, dos familiares e de uma equipe profissional multidisciplinar visando à reabilitação global do paciente. O uso de medicamentos só é indicado quando surgem complicações e comorbidades.
A Publicação da Página “Inocência Austista”
Para finalizar este artigo vamos comentar rapidamente sobre a publicação da página “Inocência Autista”. Embora a página mencione que a publicação seja fruto de diversas pesquisas, na verdade, ela é praticamente uma cópia do texto publicado por Daia Florios, do site “GreeMe”, em novembro de 2018. O texto de Daia Florios, por sua vez, é basicamente uma cópia traduzida do texto da jornalista italiana Dominella Trunfio, publicado em maio de 2018.
E, tanto o artigo de Daia, quanto a cópia publicada na página “Inocência Autista” possuem um problema em comum: a foto de uma criança/adolescente numa camisa de força, que não foi tirada de nenhum instituto psiquiátrico italiano. A foto foi tirada pelo antropólogo e jornalista britânico George Georgiou durante sua visita a três institutos psiquiátricos na Sérvia e no Kosovo, entre 1999 e 2002 (link direto)! Novamente, a condição clínica da criança/adolescente não foi mencionada pelo fotógrafo.
E a História Sobre Villa Azzurra?
A história sobre Villa Azzurra é verdadeira! Aliás, não há outra palavra para definir Giorgio Coda, um professor e psiquiatra italiano: monstro. Ele foi vice-diretor do Hospital Psiquiátrico de Turim (Ospedale psichiatrico di Torino) na comuna de Collegno, e diretor da villa Azzurra, um instituto psiquiátrico para crianças na comuna de Grugliasco. Ele foi apelidado de “O Eletricista” (L’elettricista) pelo mau uso da terapia eletroconvulsiva.
Seu “tratamento médico” consistia na aplicação de corrente elétrica, por um longo tempo, nos órgãos genitais e na cabeça dos pacientes com transtornos mentais. O “tratamento” não fazia o paciente perder a consciência e causava fortes dores. Segundo Giorgio Coda, esse “tratamento” tinha o objetivo de curar o paciente. Alternativamente, o “tratamento” era chamado de “eletromassagem” ou “eletrochoque”, dependendo da região do corpo onde era aplicado. O “tratamento” era praticado sistematicamente sem anestesia e, às vezes, sem qualquer pomada ou dispositivo de proteção de borracha na boca, o que fazia com que os dentes do paciente fossem literalmente arrancados durante os procedimentos. Durante o julgamento, Giorgio Coda admitiu ter praticado cerca de 5.000 “eletromassagens” em sua carreira.
Esse “tratamento” também era administrado a alcoólatras, viciados em drogas, homossexuais e masturbadores compulsivos. Portanto, não era algo específico contra pacientes com transtornos mentais. Isso gerou um medo tão forte do “tratamento”, que a maioria dos pacientes, pelo menos temporariamente, desistia de cometer seus atos e mudava o comportamento. Durante o julgamento, no entanto, ficou claro o propósito coercitivo e punitivo das “eletromassagens”, que não eram instrumentos de cura, mas instrumentos atrozes de tortura e punição, usados também em crianças. Enfim, peço desculpas, mas não irei prosseguir com mais detalhes, porque é muito revoltante.
E as Outras Duas Fotos da Publicação? São de Crianças Internadas em Villa Azzurra?
Em princípio, sim! As outras duas fotos (abaixo) teoricamente foram tiradas em Villa Azzurra.
E como podemos ter uma noção disso? Bem, essas duas fotos aparecem no terceiro episódio (“Torino, il manicomio dei bambini: dal buio alla luce, storie di rinascita“) de uma websérie chamada “Pazza Libertà – 40 anni di legge Basaglia” e são associadas a Villa Azzurra.
Confira o episódio, abaixo:
A websérie foi exibida em 2018 e foi produzida pelo jornal italiano “La Repubblica”.
Conclusão
Fora de Contexto! Embora essa foto seja verdadeira, e tenha sido tirada pelo fotojornalista francês José Nicolas, no interior de um hospital psiquiátrico de um vilarejo chamado Deir al-Qamar, no Líbano, em 1983, ela não necessariamente se refere a crianças autistas. Tanto a descrição da foto no site do fotógrafo quanto no repositório de imagens “Getty Images” não mencionam que se tratam de crianças autistas.
Além disso, a foto não necessariamente retrata uma medida rotineiramente adotada por enfermeiras ou médicos desse hospital. Contudo, elas poderiam ser ocasionalmente mantidas daquele jeito? Não sabemos, porque não há informações sobre isso. O que sabemos é que aquela foto retrata uma situação improvisada em meio a uma violenta guerra civil. O hospital havia sido severamente afetado e faltava de tudo, incluindo leitos.
Portanto, é impreciso associar essa foto, especificamente, a crianças autistas e dizer que elas, independentemente de seus quadros clínicos, eram habitualmente amarradas naquele local. Sinceramente, diante do que temos conhecimento, essa foto jamais deveria ser utilizada como bandeira para quaisquer causas.