Conspirações
O Brasil ignorou a 1ª oferta de vacinas da Pfizer em prol de uma oferta melhor em 2021?
Publicações afirmam que o Governo Federal teria recusado a primeira oferta de 70 milhões de vacinas da Pfizer para aceitar uma de 100 milhões no futuro! Será verdade?
Na segunda semana de maio de 2021, diversas publicações feitas nas redes sociais afirmaram que o Governo Federal teria recusado a primeira oferta de 70 milhões de vacinas dos laboratórios Pfizer propositalmente em vista de um contrato posterior, onde pode negociar quantidades maiores com menores prazos de entrega.
Em apenas uma das publicações, feita no dia 13 de maio de 2021 pelo deputado estadual André Fernandes em seu perfil do Facebook, as afirmações já haviam alcançado mais de 3 mil curtidas e quase mil comentários.
Postagens de mesmo teor também foram feitas em outras redes sociais, como no Twitter por exemplo, obtendo igual engajamento.
Afinal, será que o Governo Federal recusou a primeira oferta de compra de vacinas da Pfizer de olho em melhores condições no futuro?
Verdade ou mentira?
No dia 13 de maio de 2021, a CPI da Pandemia ouviu o depoimento do gerente-geral da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo, que disse aos parlamentares que o laboratório fez não só uma, mas três ofertas de venda de vacinas contra a COVID-19 para o Brasil em 2020.
De acordo com Carlos Murilo, foi apresentado no dia 16 de julho de 2020 uma “expressão de interesse”, documento semelhante ao que foi enviado a todos os países procurados pela empresa. Ao todo, foram apresentadas 3 ofertas de venda para o Brasil nos dias 14, 18 e 26 de agosto de 2020, sendo que em 11 novembro, a Pfizer reduziu sua oferta ao Brasil apenas ao contrato de 70 milhões de doses do imunizante. Devido ao atraso na resposta do país à oferta, a empresa já não poderia garantir entregas ainda para 2020.
O depoente também explicou que duas semanas depois a empresa repetiu a oferta, com algumas condições diferentes “com base no registro sanitário aprovado” (que também foi recusada) e a próxima oferta só voltou a ser feita em fevereiro de 2021.
Abaixo, um resumo do cronograma da negociação das vacinas entre a Pfizer e o Governo Federal:
- Maio e junho de 2020: Reuniões iniciais sobre status de desenvolvimento da vacina
- 16 de julho: apresentado uma “expressão de interesse” com resumo de condições de compra do imunizante;
- 6 de agosto: Ministério da Saúde manifestou possível interesse na vacina;
- 14 de agosto: Pfizer fez a primeira oferta: uma com 30 milhões de doses e outra com 70 milhões, com possível cronograma de entrega durante o final de 2020 e 2021;
- 18 de agosto: Segunda oferta, com 30 e 70 milhões de doses com previsão de entrega ainda para 2020;
- 26 de agosto: Terceira oferta, mas com entrega para primeiro trimestre de 2021;
- 11 de novembro: Oferta de 70 milhões com 2 milhões no primeiro trimestre, 6,5 milhões no segundo trimestre, 32 milhões no terceiro trimestre e 29,5 milhões no quarto trimestre.
- 24 de novembro: Mesma oferta anterior, mas com condições diferentes tendo como base o registro sanitário aprovado;
- 15 de fevereiro de 2021: Oferecidas 100 milhões de doses com 8,7 milhões no segundo trimestre, 32 milhões no terceiro trimestre e 39 milhões no quarto trimestre;
- 8 de março: O Governo finalmente assina um contrato de compra de 100 milhões de doses do imunizante da Pfizer, sendo 14 milhões no segundo trimestre e 86 milhões no terceiro trimestre de 2021;
- 23 de abril: O segundo contrato por mais 100 milhões de doses, considerando 30 milhões no terceiro trimestre de 2021 e 70 milhões no quarto trimestre de 2021 foi apresentado e ainda está em fase final de tratativas.
O governo não deu respostas
Segundo o depoente, a primeira oferta feita pela Pfizer tinha validade de 15 dias e o Governo Federal não respondeu:
“Passados esses 15 dias, o governo do Brasil não rejeitou e nem aceitou a conversa. Não tivemos resposta […] Todas as propostas que mencionei anteriormente foram formalizadas em documentos enviados ao Ministério da Saúde.”, disse Carlos Murillo à CPI.
Como resumiu bem o jornal O Tempo, o diretor geral da Pfizer na América Latina afirmou na CPI da Covid que a farmacêutica fez oito ofertas ao Governo Federal, sendo que apenas em março de 2021 – quase sete meses depois da primeira oferta – é que foi fechado o primeiro contrato para compra de vacinas contra a Covid.
Ou seja, até agosto de 2020, o Governo Federal poderia ter negociado lotes do imunizante para receber pelo menos 1,5 milhões da vacina da Pfizer ainda naquele ano, mas só foi assinar mesmo a compra sete meses depois, pagando ainda mais caro pelo produto.
De acordo com uma nota técnica assinada por Laurício Cruz, diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, O Governo Federal irá pagar US$ 12 por unidade da vacina (algo em torno de R$63) na segunda compra. Ou seja, 20% mais caro do que o negociado no primeiro contrato da farmacêutica americana com o Ministério da Saúde, em que foi adquirida quantidade igual do imunizante. Isso dá algo em torno de R$ 1 bilhão a mais do que o valor anterior, valor esse que sai do bolso de todo “cidadão de bem” desse país por causa do descaso dos governantes.
O presidente foi contra vacina
Grande parte do entrave na compra das vacinas, não só as da Pfizer como de outros laboratórios, se devem à negação da eficácia desse tipo de abordagem por parte do presidente Jair Bolsonaro. Como podemos ver nesse vídeo do portal UOL, o presidente sempre se mostrou publicamente contra o imunizante:
Nesse outro vídeo, mais declarações do presidente sobre a vacinação:
Em outubro de 2020, o presidente cancelou a compra de vacinas da Sinovac, um dia após o Ministério da Saúde assinar o contrato:
Conclusão
É errado afirmar que o Governo Federal recusou uma oferta de compra de 70 milhões de vacinas da Pfizer em 2020 de olho em uma oferta melhor no ano seguinte. As compras só assinadas em 2021 com o laboratório atrasaram em muitos meses o início das vacinações!