Falso
Camarão com vitamina C – Você pode se envenenar com Arsênico!
A ingestão de camarão juntamente com vitamina C causa a morte por envenenamento de arsênico? Descubra a verdade aqui!
Esse texto, afirmando que a ingestão conjunta de camarão com vitamina C provocou a morte de uma mulher na Tailândia, circula aqui no Brasil desde 2003, mas é derivado de um texto mais antigo, de 2001 – em inglês.
O e-mail-corrente apresenta várias características de outros hoaxes que já pesquisamos aqui no E-farsas:
– Texto impreciso;
– Apresenta informações desencontradas;
– Não mostra os nomes das “vítimas”;
– Tem um tom alarmista;
– Trata de um assunto que realmente interessa, que é a saúde do leitor;
– Pede para ser repassado “a tantos quanto puder”;
Já pesquisamos aqui no E-farsas vários e-mails alarmistas como esse. Em todos textos pesquisados, a cara é a mesma!
Vamos começar a analisar o texto desde o inicio:
“Em Taiwan, uma mulher morreu de repente com sinais de hemorragia em seus ouvidos, nariz, boca e olhos. Depois de uma autópsia preliminar, foi diagnosticado como “causa mortis” envenenamento por arsênico. Mas qual foi a origem do arsênico ?”
Em Taiwan? Uma mulher? A “notícia” veio faltando uns pedaços! Qual é o nome da mulher? Em que cidade aconteceu o fato?
Tudo bem que, talvez, o nome da moça tenha sido preservado, mas uma notícia tão importante como essa teria que ser melhor divulgada! Aliás, procuramos por essa “notícia” na web e todos os resultados que encontramos era de sites e blogs que reproduziam essa história.
O que provoca o envenenamento por arsênico?
Em entrevista ao site do Dr. Drauzio Varella, o Dr. Anthony Wong – médico pediatra e toxicologista no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo – diz que:
“O arsênico é tóxico e o trióxido de arsênico é um dos mais poderosos poluentes ambientais. Em Bangladesh, por exemplo, já ficou provado que as pessoas apresentam problemas graves de saúde porque a água é contaminada por esse elemento. No entanto, em recente congresso médico, foi discutido que o trióxido de arsênico As2O3 é uma das mais promissoras moléculas para o combate ao câncer. Só o FDA (Food and Drugs Administration), órgão respeitado internacionalmente, reconhece mais de doze indicações formais – por exemplo, leucemia mielóide aguda, leucemia mielóide crônica, leucemia linfóide, câncer de pulmão do tipo pequenas células, etc. – para o uso de arsênico só que em doses infinitamente pequenas. Dados como esse me fazem crer que será necessário rever antigos conceitos da medicina e o conhecimento que temos a respeito de medicamentos fitoterápicos para estabelecer novos critérios terapêuticos.“
O site da Associação Brasileira de Medicina Complementar nos traz a seguinte informação:
“A toxicidez do arsênico pode causar hálito e suor com odor de alho, desconforto físico, anemia com leucopenia moderada e eosinofilia, problemas digestivos (anorexia, náuseas, vômitos, constipação ou diarréia), circulatórios (vasodilatação leve com aumento da permeabilidade capilar podendo causar nos casos mais graves uma necrose de extremidades conhecida como a doença dos pés pretos), cardíacos (lesão do miocárdio com prolongamento do intervalo QT e ondas T anormais), neurológicos (neuropatia periférica com formigamento e sensação de agulhadas em mãos e pés), musculares (cãibras e fraqueza em pernas e pés podendo haver dificuldade para andar nos casos mais graves) e dermatológicos (hiperpigmentação principalmente no pescoço, pálpebras, mamilos e axilas, vitiligo, hiperqueratose, queda de cabelo, estrias nas unhas e câncer). A toxidez do arsênico é rapidamente excretada através do rim, assim, se os níveis dos cabelos forem elevados existe uma exposição constante. ”
Ou seja, se a tal mulher tivesse sido vítima do arsênico, não teria sangrado pelos “ouvidos, nariz, boca e olhos”, como o texto afirma! Os efeitos da exposição (prolongada) ao elemento químico são outros.
Mas, vamos supor que nesse caso ocorreu a morte instantânea da mulher… vamos dar mais corda ao autor desse brilhante texto! Nas próximas linhas, temos:
“…A policia, então, iniciou uma profunda e extensa investigação. Um professor de medicina foi convidado para ajudar a resolver o caso.
O professor cuidadosamente examinou os restos existentes no estômago da vítima, e, em menos de meia hora, o mistério foi elucidado. O professor disse: “ O óbito não se deu por suicídio nem por assassinato, a vítima morreu acidentalmente por ignorância ! “”
Analisando esses dois parágrafos, podemos concluir que:
– A polícia, quando se vê incapaz de descobrir a causa da morte de alguem, pede ajuda aos universitários!
– Um professor (que não tem nome!), nas horas vagas também deve trabalhar na área forense (por que não? O salário de professor lá também deve ser uma porcaria!)
– Uma “profunda e extensa” investigação demora menos de meia hora!
– O professor, quando resolveu o mistério e descobriu o que todos não haviam descoberto, fez o maior suspense, assim como nos livros de Agatha Christie;
– A ignorância também mata!
Prosseguindo:
“Todos ficaram intrigados, por quê morte acidental? O arsênico ataca os militares americanos que transportam mudas de arroz H Gao…”
A grande dúvida que fica no ar é:
O que tem a ver o fato dos militares transportarem mudas de arroz com o camarão?
Também nem conseguimos descobrir se essa informação é verdadeira. Será que as mudas arroz estão mesmo matando os militares americanos? Você já parou para pensar que se isso for verdade, os exércitos “inimigos” dos americanos poderiam ataca-los facilmente com bombas de arroz?
Mas, voltando ao texto:
“O arsênico foi produzido no estômago da vítima”. A vítima tomava Vitamina C todos os dias, que por si só não é nenhum problema. O problema é que ela comeu uma quantidade grande de camarão no jantar. Comer camarão não foi o problema, já que nada aconteceu à sua família que também comeu do mesmo camarão. Entretanto, na mesma ocasião, a vítima também tomou Vitamina C; é aí onde reside o problema.
Pesquisadores da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, descobriram através de experiências, que alimentos, como camarão “casca mole” contem alta concentração de compostos de 5-potassio-arsenico.”
Aí está a maior besteira do texto: O arsênico é um elemento quimico quem não deriva de nenhum outro! Também o tal de 5-potassio-arsenico não existe!
Depois de mais um parágrafo com mais uma salada de palavras e letras, o autor tenta nos convencer de que o 5-potassio-arsenico perde o potássio (que some misteriosamente!) e acaba se transformando no arsênico! Durante a explicação, o autor se esquece que a formula correta do “potássio arsênico” seria As4O5!
Também, se pesquisarmos por “5-potassium arsenic“, no site da Universidade de Chicago, não encontramos nenhum estudo a respeito! Ou seja, os caras de lá não fizeram nenhuma experiencia sobre isso!
E essa parte?
“O venenoso arsênico faz parte do magma e causa paralisia nos pequenos vasos sangüíneos, “mercapto Jimei” ??, inibindo a atividade do fígado e produzindo a necrose da gordura ataca os lobos hepáticos, coração, rins, produz congestão intestinal, necrose das célulasepiteliais, telangiectasia. Portanto, quem morre envenenada pelo arsênico apresenta sangramento dos ouvidos, nariz, boca e olhos.”
O magma fica, na verdade, abaixo da superfície da terra e não tem nada a ver com o bolo alimentar! Segundo o Wikipedia, o Magma é o nome dado a rocha fundida debaixo da superfície da Terra que, quando expelida por um vulcão, dá origem à lava. Localiza-se normalmente dentro de câmaras magmáticas, entre os 15 e os 150 km de profundidade. Talvez, a ideia do autor era de dizer “bolo alimentar”.
E o que quer dizer “mercapto Jimei”? Não encontramos nada a respeito, além dos sites e blogs que repetiam esse mesmo texto.
E para finalizar, uma variação da célebre frase pedindo para que o hoax seja repassado ao maior numero de pessoas possível:
“Depois de ler isto, por favor, não seja egoísta. Encaminhe este texto a tantos quanto puder.”
E ainda: Nos comentários do excelente post sobre esse assunto no blog Mente e Coração, o visitante Ricardo indaga: “E aquele camarãozinho com limão, hein?”. De fato, apesar da pequena quantidade de vitamina C encontrada na fruta, já seria o suficiente para envenenar a vítima.