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Chineses estão comprando fazendas no Ceará e mulheres para ter filhos e legalizar a permanência no Brasil?

Conspirações

Chineses estão comprando fazendas no Ceará e mulheres para ter filhos e legalizar a permanência no Brasil?

Chineses estão comprando fazendas no Ceará e mulheres para ter filhos e legalizar a permanência no Brasil?

Começou a circular recentemente nas redes sociais um texto altamente conspiratório, que faz uma série de acusações contra chineses radicados no Brasil. O texto é totalmente alarmista, um tanto quanto desconexo, repleto de erros de português, e tenta fazer com que o leitor o espalhe por uma suposta ameaça a soberania nacional.

Confira algumas publicações que começaram a surgir no Facebook:

Sequência de publicações que vêm sendo disseminadas no Facebook.

Um dos textos que encontramos no Facebook.

Entretanto, será que esse texto faz sentido? Chineses estão comprando terras no Ceará, além de mulheres com o intuito de ter filhos e legalizar a permanência no Brasil? Descubra agora, aqui, no E-Farsas!

Verdadeiro ou Falso?

Falso! Não há nenhuma prova que isso esteja acontecendo. Todas as demais alegações, exceto uma envolvendo uma empresa australiana, também não fazem o menor sentido. Aliás, analisando o texto inteiro, e usando os critérios necessários para que um estrangeiro consiga visto permanente no país, isso (ser casado ou ter filhos) faz ainda menos sentido.

A seguir, vamos destrinchar esse texto para vocês!

1) Trecho: “Chineses aqui no Ceará estão comprando grandes fazendas a preço de banana em final de feira. São grandes extensões de terras aparentemente improdutivas.

Essa narrativa de que os chineses ou estrangeiros de modo geral estão comprando terras brasileiras vem desde a campanha eleitoral de 2018, mas realidade é bem diferente.

Segundo uma matéria publicada no site do jornal “Gazeta do Povo”, em dezembro de 2018, “a venda de terras para estrangeiros está praticamente estagnada desde 2010, por conta das duras regras vigentes sobre esse tema. A flexibilização dessas regras é, até, uma demanda do próprio agronegócio que apoia Bolsonaro: os produtores querem abrir a porteira para entrada de investidores internacionais, o que não ocorre hoje

Essa narrativa de que os chineses ou estrangeiros de modo geral estão comprando terras brasileiras vem desde a campanha eleitoral de 2018, mas realidade é bem diferente.

Ainda segundo a matéria, “até 1998, uma lei de 1971 permitia que empresas estrangeiras com sede no Brasil comprassem terras no País. Naquele ano, a AGU interpretou que empresas nacionais e estrangeiras não poderiam ser tratadas de maneira diferente e, por isso, liberou a compra. Em 2010, a AGU mudou de posicionamento, restabelecendo o entendimento original“.

Um estudo chamado “A Expansão Internacional da China Através da Compra de Terras no Brasil e no Mundo”, de 2014, também apontava nessa direção:

A estratégia dos chineses em comprar terras para produção de grãos no Brasil não tem sido muito bem sucedida, em particular, após o parecer da AGU (Advocacia Geral da União) de 2010, pelo menos segundo as informações divulgadas. Por essa razão, os investimentos chineses têm sido direcionados para investimentos industriais que permitem uma presença mais ativa no complexo agroindustrial brasileiro como uma forma de garantir um suprimento de grãos necessário para atender à demanda chinesa

Algo mudou desde então?

Não. Há discussões sobre isso no Congresso Nacional, mas nada mudou desde então.

2) Trecho: “…no município de Santa Quitéria tem uma MINA DE URÂNIO LACRADA PELO GOVERNO GEISEL. E eles compraram tudo em volta.

Considerando o que acabamos de dizer, esse trecho já seria, no mínimo, suspeito, mas ele é problemático por outras razões.

Embora haja uma mina de urânio e fosfato (tem muito mais fosfato que urânio) em Santa Quitéria, cidade do interior do Ceará, essa mina não pertence aos chineses. A mina encontra-se numa fazenda chamada Itatiaia, cujos direitos de exploração pertencem às Indústrias Nucleares do Brasil (INB).

Embora haja uma mina de urânio e fosfato (tem muito mais fosfato que urânio) em Santa Quitéria, cidade do interior do Ceará, essa mina não pertence aos chineses.

E quem é a INB? Eis o que é mencionado em sua página oficial na internet:

Empresa estatal de economia mista vinculada ao Ministério de Minas e Energia, exercemos, em nome da União, o monopólio da produção e comercialização de materiais nucleares. Também atuamos na execução de serviços de engenharia do combustível e na produção de componentes dos elementos combustíveis

Diga-se de passagem a exploração da mina até hoje não saiu do papel. Essa é uma história muito longa, e caso tenham interesse em saber mais detalhes cliquem aqui, aqui, e aqui.

3) Trecho: “Assim como em Canindé que tem GRAFITE, que está sendo mapeado por uma empresa australiana e em breve começarão a extração comercial

O texto não era sobre os chineses? Então, qual o motivo de falar sobre uma empresa australiana?

Enfim, Canindé é uma outra cidade cearense, e o máximo que encontramos sobre esse assunto foram pesquisas divulgadas em 2014 por uma companhia canadense chamada Lara Exploration, que tinha um projeto para a exploração do grafite numa determinada região do Estado. Naquele mesmo ano, a Lara Exploration anunciou que uma empresa australiana chamada Paradigm Metals tinha sido escolhida para explorar o grafite.

Contudo, não encontramos mais detalhes sobre essa história ou o que aconteceu depois disso.

4) Trecho: “Aqui já corre conversas de um grande esquema ainda nestas aquisições… CHINESES LITERALMENTE COMPRANDO MOÇAS DA ROÇA E CASANDO E TENDO FILHOS PARA LEGALIZAR NEGÓCIOS E SITUAÇÃO DE PERMANÊNCIA NO BRASIL

Talvez essa seja o trecho mais absurdo do texto.

Em primeiro lugar, não há nenhuma prova que cidadãos chineses estejam comprando mulheres ou fazendo casamentos arranjados em massa para legalizar negócios e a situação de permanência no Brasil. Em segundo lugar, embora estar casado, em união estável (basicamente morando junto) ou ter filhos nascidos no Brasil seja alguns dos critérios passíveis de um visto permanente em nosso país, a narrativa é completamente falha, porque ignora outros critérios bem relevantes no contexto do texto.

Não há nenhuma prova que cidadãos chineses estejam comprando mulheres ou fazendo casamentos arranjados em massa para legalizar negócios e a situação de permanência no Brasil.

Segundo uma matéria publicada no site “Valor Econômico”, em 2015, cidadãos estrangeiros que investissem entre 150 mil e 500 mil reais em atividades produtivas no Brasil poderiam receber um visto de permanência.

Eis o que foi mencionado:

O Brasil poderá autorizar a concessão de visto permanente quando o valor do investimento estiver abaixo de R$ 500 mil (desde que não seja inferior a R$ 150 mil) para o empreendedor que pretenda fixar-se no Brasil com o propósito de investir em atividade de inovação, de pesquisa básica ou aplicada, de caráter científico ou tecnológico

Dinheiro é Poder

Segundo a BBC, numa matéria intitulada “A bilionária indústria global de ‘venda de cidadania'”, desde novembro de 2018, uma resolução autoriza a concessão de residência a estrangeiros que comprarem imóveis a partir de R$ 700 mil (no Norte e no Nordeste) e R$ 1 milhão (nas demais regiões). Segundo um texto publicado no UOL, no entanto, propriedades rurais não estão incluídas nessa história, somente propriedades localizadas em áreas urbanas.

Portanto, não é estritatamente necessário casar, morar junto ou ter filhos para conseguir um visto de permanência no Brasil, quanto mais, literalmente, comprar pessoas. Basta ter dinheiro, assim como acontece em muitos países ao redor do mundo. Se os chineses estivessem com um projeto de poder conforme apontado pelo texto, não precisariam casar para isso.

5) “A CHINA jogou este vírus no mundo, fez o lockdown e agora estão aproveitando as falências pra comprar tudo. Tudo planejado de forma maquiavélica por mentes monstruosas dos tiranos do comunismo

Esse é um ponto que cansa repetir, mas vamos lá. De forma curta e grossa, não há provas que o vírus SARS-CoV-2 tenha sido criado em laboratório, assim como que a pandemia tenha sido um projeto de poder da China.

Simples assim.

6) “Já compraram a maior distribuidora de soja do Brasil.

Não encontramos informações sobre qual empresa seria a maior distribuidora de soja do Brasil. Aliás, o texto sequer menciona nomes, o que dificulta substancialmente a verificação. Caso encontremos essa informação posteriormente faremos uma atualização, combinado?

Conclusão

Falso! Não há nenhuma prova que isso esteja acontecendo. Todas as demais alegações, exceto uma envolvendo uma empresa australiana, também não fazem o menor sentido. Aliás, analisando o texto inteiro, e usando os critérios necessários para que um estrangeiro consiga visto permanente no país, isso (ser casado ou ter filhos) faz ainda menos sentido.

Jornalista e colaborador do site de verificação de fatos E-farsas entre janeiro de 2019 e dezembro de 2020. Entre junho de 2015 e abril de 2018, trabalhei como redator do blog AssombradO.com.br, além de roteirista do canal AssombradO, no YouTube, onde desmistificava todos os tipos de engodos pseudocientíficos e casos supostamente sobrenaturais.

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