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O Governo da Bolívia proibiu o cristianismo?

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O Governo da Bolívia proibiu o cristianismo?

É verdade que o presidente da Bolívia Evo Morales sancionou uma lei que torna crime o culto religioso em todo país?

A notícia começou a se espalhar através de diversas publicações em sites evangélicos no começo de janeiro de 2018 e foi bastante compartilhada também nas redes sociais. De acordo com o texto, o governo boliviano de Evo Morales teria criado uma lei criminalizando toda e qualquer forma de evangelização, incluindo cultos religiosos e pregações em locais públicos e privados!

Será que essa história é real? Evo Morales está proibindo o cristianismo em toda a Bolívia?

O Presidente da Bolívia proibiu o cristianismo em todo o pais? (foto: Reprodução/Facebook)

Verdade ou farsa?

Para começarmos a entender se isso é verdade ou mentira, é preciso entender que 16% da população boliviana se declara protestante enquanto que 76% dos bolivianos se declaram católicos. Ou seja, pelo menos 93% do povo da Bolívia se considera cristã!

Você acha mesmo que um governo seria tão imprudente a ponto de criminalizar 93% de seus eleitores?

Pois é! Se um presidente resolvesse proibir os cristãos de praticarem a sua fé, certamente perderia 93% (ou mais) de seus votos nas próximas eleições (além de sofrer com intensos e intermináveis protestos e manifestações)!

Uma medida tão impopular como essa colocaria o presidente Evo Morales em uma situação muito difícil, principalmente agora, quando ele tenta apoio para a sua quarta reeleição.

A Lei existe?

Tudo começou com a interpretação equivocada de um artigo do Novo Código Penal (que ainda não entrou em vigor na Bolívia). Mais precisamente, no Capítulo III, Seção I, Artigo 88:

“ARTÍCULO 88. (TRATA DE PERSONAS) I. Será sancionada con prisión de siete (7) a doce (12) años y reparación económica la persona que, por sí o por terceros, capte, transporte, traslade, prive de libertad, acoja o reciba personas con alguno de los siguientes fines:
[…]

11. Reclutamiento de personas para su participación en conflictos armados o en organizaciones religiosas o de culto;”

A verdade é que, como foi muito bem explicado por esse excelente artigo do Xadrez Verbal, esse artigo não trata de proibições religiosas, mas se refere ao tráfico, venda, comércio, privação de liberdade de seres humanos, e mais uma lista que abrangem esse crime. Aí, incluem-se mendicância forçada, chegando até ao polêmico inciso 11, que diz que quem comercializar, escravizar, comprar ou vender uma pessoa – privando-a de sua liberdade em prol de um conflito armado ou de organizações religiosas – poderá ser presa!

O artigo cobriria também uma conversão forçada de uma comunidade indígena, por exemplo (o que já ocorreu e ainda ocorre até hoje por aí).

Como relataram alguns sites evangélicos (ao que parece, os únicos que não viram com bons olhos esse artigo do novo código penal da Bolívia), os religiosos protestaram pelo “direito” de capturar, transportar, transferir, privar de liberdade ou de receber pessoas para fins de recrutamento em organizações religiosas…

Pastores estavam reclamando que (caso o novo Código Penal foi sancionado) não poderiam mais levar à força os dependentes químicos para se tratarem em suas igrejas!

Uma das provas de que essa lei não trata de punir os religiosos é que no mesmo código penal há incisos que prevêem agravantes em caso de furto ocorridos em locais religiosos ou de cultos. O bandido que furtar alguma coisa dentro de uma igreja, por exemplo, teria uma pena maior do que quem roubar alguém na rua.

É claro que a Lei não é perfeita (não estamos aqui defendendo nenhum governo). Tanto é que já foram modificados vários artigos após inúmeros protestos de várias categorias (jornalistas, motoristas, estudantes…), como esse ocorrido durante 3 dias seguidos em nove regiões da Bolívia. A Central Operária Boliviana (Cob) – que já foi aliada de Morales no passado – exigia a anulação de um decreto que ordena o fechamento de uma fábrica têxtil do Estado, bem como alteração a outras regras sobre o funcionamento das empresas públicas, pensões e os direitos dos trabalhadores.

Código Penal Revogado

Diante de tanta polêmica, no dia 21 de janeiro de 2018, o presidente Evo Morales anunciou a revogação do novo Código Penal antes mesmo da sua promulgação.

Em seu perfil no Twitter, o presidente afirmou que [eles] decidiram revogar a nova lei (e aproveitou para atacar a Direita):

https://twitter.com/evoespueblo/status/955090276271493120

“Treta” antiga

Esse “mal-estar” criado entre a Igreja e Evo Morales não é recente! Conforme mostrado nessa matéria da Folha de São Paulo, o atrito entre as partes se agravou em setembro de 2017, após a aprovação de uma lei que legaliza o aborto antes de oito semanas de gestação e quando a mãe é estudante ou tem dependentes.

Conclusão

As religiões não estão proibidas na Bolívia! Tudo começou com uma confusão gerada por um parágrafo mal escrito (e mal interpretado) em um artigo do novo código penal daquele país, que nem chegou a entrar em vigor!  

Gilmar Henrique Lopes é Analista de Sistemas e, em 2002, criou o E-farsas.com (o mais antigo site de fact checking do país!) que tenta desvendar os boatos que circulam pela Web. Gilmar é o autor do livro "Caçador de Mentiras" pela Editora Matrix e da aventura de ficção infantojuvenil "Marvin e a Impressora Mágica"!

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