Será verdade que existe um lugar no Cazaquistão onde uma floresta cresce de cabeça para baixo?
No dia 3 de janeiro de 2019, o site “Fatos desconhecidos” publicou um artigo dizendo: “Conheça o lugar no Cazaquistão onde a floresta cresce de cabeça para baixo”. Logo no início do texto é informado, que “em meio às florestas das Montanhas Tian Shan, no Cazaquistão, há um lago. Mas não qualquer lago. Suas águas azuis e cristalinas mostram algo único, uma floresta de ponta a cabeça. E não isso não é nenhuma invenção humana ou algum tipo de monumento.”
Entretanto, será que isso é realmente verdade? Existe mesmo uma floresta invertida no Cazaquistão?
Verdadeiro ou Falso?
O artigo publicado no site “Fatos Desconhecidos” é uma mistura de alegações verdadeiras e falsas. No entanto, as informações falsas mudam completamente o entendimento do leitor sobre o que realmente existe no Cazaquistão. Vamos começar pelos acertos do artigo.
Os Acertos
- De fato, existe um lago chamado Kaindy, localizado no sul do Cazaquistão. Ele é um lago de 400 metros de extensão, cuja profundidade pode chegar até 30 metros em alguns pontos, e está a uma altitude de aproximadamente 2.000 metros acima do nível do mar. Dizem que a temperatura de suas águas nunca (ou raramente) ultrapassa 6ºC, mesmo durante o verão (no inverno o lago congela). O lago faz parte do Parque Nacional dos Lagos Kolsai, que está localizado em uma vale muito bonito em meio a encosta norte das chamadas Montanhas de Tian Shan.
- O lago acabou sendo formado devido a um grande deslizamento de calcário, que gerou uma espécie de represa natural. Aliás, esse calcário é um dos principais responsáveis pela bela coloração da água, de tonalidade azul-turquesa. Esse deslizamento bloqueou o desfiladeiro, que acabou sendo preenchido por água ao longo dos anos devido aos rios que acabam se formando nas montanhas oriundos do derretimento da neve, e ocasionalmente precipitações.
- O agente causador do deslizamento foi realmente um grande terremoto ocorrido na região, de magnitude 7.7, em 1911. Provavelmente, naquela época, deve ter sido um caos devido a quantidade de avalanches e deslizamentos de terra. Enfim, fato é que muitas árvores das encostas deslizaram para o vale, que as poucos foi, grosso modo, “se enchendo de água”. Tudo certinho, conforme é contado até hoje.
Os Erros
- No texto é dito que: “Os pinheiros parecem estar conservados. As folhas, os pequenos galhos, tudo está como antes.“
Isso não é verdade. Na realidade, o que temos no lago são algumas dezenas de troncos mortos de árvores, que já estavam ali antes do terremoto, e muitos outros deitados, partidos ou inclinados devido aos tremores, ao deslizamento e ao volume de terra que desceu das encostas. Há muito tempo a cobertura verde das árvores deixou de existir, tanto acima, quanto abaixo da superfície do lago.
Em muitas imagens submersas temos a impressão de que o lago preservou a folhagem das árvores (que não são mais árvores, são apenas troncos e galhos daquilo que um dia foram árvores), porém o que vemos são colônias de algas e outras plantas aquáticas, que acabaram se unindo aos galhos.
Apesar do apelido de “floresta submersa”, que o local possui, a tal “floresta” (que não é floresta) não está crescendo de cabeça para baixo, porque o que vemos não são folhas crescendo a partir de uma árvore viva e saudável. As galhos abaixo da superfície acabaram sendo preservados devido as condições do lago, e protegidos das intempéries. Já aqueles que estão acima, em sua maioria, não tiveram a mesma sorte.
- No texto também é dito que: “…a vegetação se petrificou e por isso ainda mantém sua aparência natural.”
Isso também não é verdade. Nem mesmo os troncos estão petrificados. A madeira petrificada é um fóssil. Ela se forma quando o material vegetal é enterrado pelos sedimentos e protegido da decomposição devido ao oxigênio e aos organismos. Então, a água subterrânea rica em sólidos dissolvidos flui através do sedimento, substituindo o material vegetal original por sílica, calcita, pirita ou outro material inorgânico, como opala. Esse é um processo que demora muito tempo, pelo menos uns 10.000 anos, sendo que o lago tem pouco mais de 100 anos.
Vejam alguns vídeos mostrando o lago e o que existe em suas águas:
Conclusão
Apesar de conter alegações verdadeiras sobre o Lago Kaindy e sua origem, o artigo publicado pelo site “Fatos Desconhecidos” faz com que o leitor, equivocadamente, pense que existe, de fato, uma floresta no Cazaquistão que cresce de cabeça para baixo. Na realidade, o que temos são galhos mortos repletos de colônias de algas e plantas aquáticas, daquilo que um dia foram árvores. A antiga cobertura vegetal foi extinta há muito tempo.